PERSONAS

Gracia Cantanhede

Errei a hora. Acordei e ainda estava escuro. Ao me
levantar como se tivesse asas, deslizei na cama, flutuando.
Tudo estava tomado por um manto negro. Mas o corpo ficara
alerta. Não há volta.

Às vezes me acordo para ler, quando os primeiros raios de sol
despontam convidando para a vida. Ao contrário, dormir é morrer. Um sono sem fim: deve ser isso a morte.

Levantar em um horário fora de hora tráz vantagens. É uma
libertação estar só. Há sentimento de posse: sou dona do mundo.
Reparem. Não há barulho, não vemos ninguém.
Não existem máscaras. Somos só eu e a noite.

Depois começa a clarear e tudo vai tomando outra cara.
Pássaros arrulham, algum carro ao longe, uma nesga
branca rasga a casa pela fresta. A luz do farol, do alto, chega
invasora.
É quando transmudo-me.
Sou outra.

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