BOA NOITE

 

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Viajarei para a terra dos sonhos. Lá os ruídos da noite não entram. Somente gnomos me farão companhia. A terra de ninguém é palco do sono e vagarei por esse caminho. Aportarei na esquina da ausência, sem cansaço que sobre, sem desejo que reste. Na madrugada alta, uma estrela vestindo diáfano manto azul de luz dançará uma valsa poeta e solitária, até o amanhecer vir me dizer: bom dia!
gracia cantanhede
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ESTAMOS SEMPRE ESPERANDO, COMO NA FICÇÃO,

ESPERANDO GODOT.

SIMBOLICAMENTE SOMOS TODOS HABITANTES DO CERRADO

DESEJANDO UM DILÚVIO

E COM ELE, A BONANÇA, O VERDE

A ALQUIMIA DE NOVAS NUVENS E NOVAS CHUVAS.

ASSIM É A ESPERANÇA, CÍCLICA, COMO O TEMPO,

BROTANDO EM NÓS DESEJOS

E INCONSTÂNCIAS,

TORPEDOS DE ADRENALINA.

UMA ESPERA QUASE LÍQUIDA,

MUSICAL,

UM BEETHOVEN,

APPACIONATA,

TALVEZ.

 

gracia cantanhede

XÔ, MAU HUMOR!

Por mais que uma situação seja crítica, séria e dramática, não há necessidade de ser crua, pesada, dura e cruel, sem nenhuma pitada de leveza ou graça.
Nada nos leva a gostar de um livro, filme ou novela que mostre apenas a fraqueza e a maldade humana. Em tudo é preciso ver o outro lado da moeda. A pobreza, por exemplo, tem o seu lado leve. Ver alguém que tem pouquíssimo para si, ajudando o vizinho que não tem absolutamente nada, é de uma leveza comovente.
E o humor nos salva, em qualquer situação. A vida, com seus percalços, tem também fases ou momentos bons, descontraídos e até felizes. Por mais que alguém seja ranzinza ou pessimista, há de concordar comigo.
Até Jesus Cristo gostava de festas, casamentos e vinho, segundo estudiosos da Bíblia. E sorria! Claro, se também era humano, chorava e ria.
O papa Francisco disse em uma entrevista:“A atitude humana mais próxima à graça de Deus é o humor”. Ao longo da história do cinema acompanhamos obras primas que falam sobre isso, exemplo? “A Vida é Bela”, de Roberto Benigni,vencedor de três prêmios Oscar: melhor filme estrangeiro, melhor ator protagonista e melhor trilha sonora. É uma incrível história dramática contada em tom de fábula cômica sobre o Holocausto e um dos mais belos e divertidos hinos à vida, à liberdade e ao amor.
Arte e história estão intimamente entrelaçadas.
Não entendo a arte sem humor. Não entendo um autor de qualquer obra pesar somente nas tintas do sofrimento, da angústia, da desesperança. Prefiro a realidade, ela pode ser dura, mas terá sempre algo que nos faça rir, algum momento de descontração e beleza.
Entendo a arte como a planta nascida no caminho da nossa vida, que se desenvolve para suavizá-la. Não ao contrário, a arte nos desconsolando, nos arrastando no turbilhão de ondas revoltas de um mar bravio, sem cavalo preto que fuja a galope.
Sou otimista. Da vida eu só espero rir dos tombos, aprender com os erros, e continuar acreditando que, no fim, tudo vai dar certo
Recordando Fernando Sabino,” façamos da interrupção um caminho novo.Da queda um passo de dança,
do medo uma escada,do sonho uma ponte, da procura um encontro!”

gracia cantanhede

BOA NOITE
Viajarei para a terra dos sonhos. Lá os ruídos da noite não entram. Somente gnomos me farão companhia. A terra de ninguém é palco do sono e vagarei por esse caminho. Aportarei na esquina da ausência, sem cansaço que sobre, sem desejo que reste. Na madrugada alta, uma estrela vestindo diáfano manto azul de luz dançará uma valsa poeta e solitária, até o amanhecer vir me dizer: Bom dia!

 

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Não se preocupe em entender o que escrevo. Inventar para mim é conjunção carnal, com muito fogo. Minhas palavras ora têm tapete voador, ora são mentirosas, ora dissimuladas. Poção mágica que uso como tempero. Como ancas grandes, mexem, sem querer, com o pudor das pessoas. Às vezes um advérbio escorre pela folha e cai no precipício. Uso nome inventado para falar sobre o que sinto. Passeio pelos substantivos como se fossem adjetivos, inverto a grafia do dicionário. Brigo com a gramática, rasgo o verbo. E vejo o pronome como se fosse interjeição. No mais, tenho alma prolixa e ouvidos surdos, e minha memória é mais sensível do que eu.

 

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O casaco ficou na cadeira ao lado da porta de entrada.
Os pés tocaram o assoalho, a bolsa sobre o móvel…
Só a gata silenciosa abriu os olhos preguiçosos.
Posso ser invisível e entrar voando, sem nada,
pela casa, à noite, no cenário de luz apagada.
Cada parede, cada objeto, sabe mais de mim
do que eu mesma, que mal sei da minha própria história.
Tudo aqui é familiar. No escuro o tato é rota, é guia.
Quando mais tempo temos de morada em uma casa,
mais ela nos transforma em janela e quarto e sala.
Mais nosso corpo tem o cheiro que ela exala.

gracia cantanhede

 

BOA NOITE
Viajarei para a terra dos sonhos. Lá os ruídos da noite não entram. Somente gnomos me farão companhia. A terra de ninguém é palco do sono e vagarei por esse caminho. Aportarei na esquina da ausência, sem cansaço que sobre, sem desejo que reste. Na madrugada alta, uma estrela vestindo diáfano manto azul de luz dançará uma valsa poeta e solitária, até o amanhecer vir me dizer: Bom dia!

A imagem pode conter: 7 pessoas, incluindo Carla De' Carli, pessoas sorrindoA vida pede pausas. Amigas são importantes para alegrar nossos dias.

GENTILEZA

Sujam muros, ruas, avenidas…
Depredam as catedrais.
– Meu Deus, quanta grosseria!
Falta o que se chama: respeito,
em forma de gentileza.
Os brutos não entendem
o significado dessa palavra.


Por favor, alguém explique
com toda sabedoria:
-O que é mesmo gentileza?
-É cuidado, amor, carinho…
Quase, quase, poesia.

 

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Os tempos primitivos são líricos, os tempos antigos são épicos, os tempos modernos são dramáticos.

Victor Hugo

HERESIA

 

A impressão é de que passei anos dormindo e, de repente, acordei. Não sei bem se é passado ou futuro. Fico tateando no vácuo, querendo achar luz ou algo que me ilumine. Eu mesma não consigo entender o que se passa. Estou assustada, claro! É muito difícil entender o emaranhado de ideias que passam pela minha cabeça, como relâmpagos. O real mistura-se com o irreal, fico paralisada por uns instantes. Em outros momentos tento reconhecer as pessoas que parecem passar pela minha frente. Olho, olho novamente, olho várias vezes e, nada. Vejo portas, mas estão fechadas, parece que caí em um buraco de onde não consigo sair. Tudo começa a girar. O fato é que estou apartada das pessoas. Uma caverna, talvez. E os corredores que vejo entre as pedras levam a outros corredores, mais estreitos ainda. As pessoas estão pequenas, não as reconheço, novamente não as reconheço. Parecem estar em um ritual. Símbolos inacreditáveis.
Olho para frente e vejo um deserto. E já não sei o motivo de minha inquietação. Sinto necessidade de sair desse emaranhado de sensações. Estarei no lugar errado? Na hora errada? Qual a porta de saída? Estarei perdida nesse labirinto?
– Alguns bonecos de aparência estranha, agora, olham para mim. Parecem confusos, não temos nada de parecidos.

Uma enorme jabuticaba parece controlar o ambiente.

Jabuticaba, jabuticaba, repetem as vozes.

Olho para a fenda ao longe e vejo gente gritando, parecem enlouquecidos, bradam palavras que eu não compreendo. Estarei perdendo os sentidos?

Ergo os olhos e vejo o cenário catastrófico. Coisas que não entendo, não reconheço, não consigo dar nome. É tão diferente de tudo que já tinha visto!
Véspera do Apocalipse?
Um hospício?
Quero levitar, quero sair desse caleidoscópio, figuras geométricas de vidro. Mentira, são mentiras girando ao meu lado.

Mentiras, mentiras.
Fábrica de mentiras disfarçadas de verdade. Ninguém sabe mais o que é uma coisa ou outra.

Até que alguém grita meu nome:
_Vamos embora, estamos atrasados. Vamos!

Entro em um carro e seguimos deixando para trás aquele lugar. Tudo muito tenso. Mais uma rua e avisto uma carreta com uma réplica da estátua da liberdade, ali, deitada.
O motorista explica que há dias querem desembarcar aquela coisa enorme e fincá-la por ali mesmo.
Nesse momento começo a rir. Rio alto. Rio pelos meses todos sem rir. A muito custo, paro. A descontração chega, finalmente.
O maxilar parece normal. A temperatura também. Estou bem física e mentalmente.
Um banho morno me espera.
É o tempo de pegar a bagagem. Enfim, rumo ao aeroporto.
Tudo checado…
Vamos caminhando direto para a escada do avião. Alguns passageiros de outro voo passam por nós.
Ouço conversa de alguém ao celular. Calhou.

– Hasta la vista.

Repito a frase, sorrindo:

Hasta la vista, baby.

gracia cantanhede

 

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Até onde a vista alcança rolam as águas
transbordantes
E o tempo passando ao redor do quarto
O mundo é tão pequeno visto dali
O que existe dentro de mim, tão limitado!
São as quatro paredes, iguais às do meu quarto
Nada me faz melhor do que esta reflexão:
Quão mínima sou!
Um fio de cabelo escorrendo sobre o pulôver,
a letra de um livro aberto em página qualquer.
Tantas frases em hieróglifos
embaralham-se e formam novas linhas.
Numa estranha combinação de palavras,
estou presa à rotina e às fronteiras.
Necessito de me adaptar às coisas,
a tudo que é vasto e grande e gélido,
crescendo em cima de mim mesma.
E nada para deter o tempo.

 

Gracia Cantanhede

A vida é um tabuleiro de xadrez
E o adversário é o tempo
Um jogador cruel demais
Para suportar indecisão.

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Amo cores, lugarejos, ruas que dão em lugar algum, ruas que dão em um lugar qualquer, ruas que acabam no mar.

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“Cada um tem de mim exatamente o que cativou.” Muita gente já leu essa frase em algum lugar. Não diria ser própria para para-choque de caminhão. Neles, nem os ditados populares escrevem mais. Os caminhoneiros estão apavorados com a morte de motoristas e com assaltos, sequestros e outros males que acontecem, todos os dias, nas estradas brasileiras. Já não há mais a graça de antigamente, frases que faziam brincadeiras com a sogra, por exemplo, ou com o casamento. Hoje, a vida politicamente correta afetou o humor das pessoas. Sendo por uma boa causa, vá lá, tudo bem.
Voltando à frase, deve ter sido tantas vezes copiada que ficou sem autoria, não há assinatura, mas “autor desconhecido”. Em nada, porém, diminui o valor da mensagem. Todos nós temos uma capacidade de tolerância, vamos levando na brincadeira certas atitudes menos gentis, certos traços de personalidade de algumas pessoas, mas no fundo sabemos o que é maldade ou não, sabemos a diferença entre o bem e o mal.
Cativar é encantar, seduzir, atrair, enfeitiçar, fascinar, agradar, fisgar, envolver, empolgar, conquistar, tantos sinônimos que prefiro dizer: fulano me ganhou pela sua simpatia. Do verbo ganhar, verbinho simpático, remete a aniversário, Natal, dias em que presenteamos e somos presenteados por alguém. Taí um bom motivo para ser simpático. Algumas pessoas têm sabedoria nata, conquistam a todos com sorrisos e generosidades. Essas correm, porém, risco de ser mal interpretadas. Podem ser consideradas tolas, simplórias, “atiradas”, e até idiotas.
De toda forma é melhor ser alegre que ser triste, disse o poeta.
Tudo isso para falar de egoísmo, erva daninha, grassa por todos os lados. O “eu” é valorizado além dos limites.E vocês que se danem. É o pensamento do egocêntrico.
Não aconselho ninguém a deixar crescer essa praga em seu quintal. Ou as outras plantas acabarão morrendo, sufocadas pela pior doença do ser humano: a egolatria.
Todos os males, reparem vem do egoísmo: o assassino, caso pensasse que o outro tem direito à vida, não mataria o próximo. O ladrão, idem. O corrupto, prova do individualismo, prejudica milhares de pessoas por levar vantagens indevidas. Seriam inúmeros exemplos, muitos casos a citar. Prefiro voltar à frase, para dar minha versão: não exija dos outros o que você não oferece. Preocupe-se em ser gentil, amável, valorizar as pessoas, e dê amor, compreensão, assim colherá exatamente o que semeou.

gracia cantanhede

 

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A vida é um tabuleiro de xadrez
E o adversário é o tempo
Um jogador cruel demais
Para suportar indecisão.

 

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Cheguei em um estágio da vida que não tenho a menor preocupação em saber como será o amanhã. Não que eu esteja concentrada em mim, agora, simplesmente abasteço-me de calmarias , encharco-me de paciências, vivo e me guio como a natureza, a lua, as marés, comandante-em-chefe da infantaria dos terremotos, almirante dos maremotos e brigadeira das esquadrilhas de ventos quentes e frentes frias. E valham-me as palavras lidas e ouvidas, as páginas escritas e as linhas da vida. Valham-me que sou mera carcaça sujeita às intempéries, mera embalagem transitória deste aglomerado de paixões e de infinito amor. É tudo que tenho e dou: amor.