SAIA RODADA

Mães deveriam usar sempre saias rodadas.

Aquelas de panos fartos, como sombrinhas nesgadas.

A carinha do filho escondida na roda da saia é quadro

permanente que guardo e sempre me vem à memória:

o filho querendo colo, puxando a ponta da barra,

escondendo-se da gente invasora, insensata,

fingindo não ver e vendo a mãe esmerar-se em cuidados,

com a bandeja de doces, em toalha bordada.

E o pequeno exigindo atenção, grudado na perna,

fazendo pirraça, embaixo da saia,

pedindo regaço.

gracia cantanhede

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À MEMÓRIA DE MINHA MÃE

( 5/6/1926 a 11/10/2013)

Entramos no seu apartamento e havia uma luz de meio-dia,

e havia uma quietude boa,

uma jarra de flores vivas,

uma janela entreaberta,

uma doçura infinda.

Somente você ali, sentada, como se tivesse adormecido,

tão serena, assim, quase sorrindo.

Há um ano estamos tentando esquecer aquele dia.

Há um ano estamos tentando viver sem você.

Há um ano, mudam as folhas do calendário.

Há um ano estamos órfãs de sua presença,

há um ano cultivamos a sua lembrança,

há um ano, cronometrado, nós insistimos

em lhe contar coisas do presente e do passado.

Você que sempre foi a nossa fada.

E, muitas vezes, pensamos, de verdade:

nada,você não morreu nada.*

**Gracia Cantanhede

ESPERANÇA

Hoje, bem cedo, recebi a visita de um louva-a- deus, aquele bichinho que se mistura com as folhas e parece fazer parte da vegetação. Sempre achei esse inseto, também chamado “esperança”, quase confundido com planta, fosse sinal de sorte, que trazia um recado de anjos. Agora soube não ser somente eu a pensar assim, alguns povos acreditam nisso, como acreditam em superstições, em duendes, em destino. Cada um com sua fé. E assim seja.Neste “Dia das Mães”, algumas pessoas estão solitárias, tristes, sem motivação, sem alegria. São os órfãos e as mães que perderam filhos. É para elas que escrevo: para quem está desanimado ou se julga deserdado da sorte.Frank Sinatra, com seu vozeirão, cantava “My Way” e fascinava a todos. A letra da música fala de alguém que sofreu, amou, riu, chorou, mas fez tudo isso de um jeito único. É assim também que quero levar a minha vida até o final: à minha maneira, com os meus recursos, com a minha marca, errando e acertando, mas com vontade de ir em frente e conquistar meus objetivos. Tenho medo de perder o entusiasmo. De cobrir os móveis com lençóis como quem viajou e ficará fora muito tempo. Quero ter sempre a alegria de arrumar a casa, de fazer comidas saborosas, de reunir pessoas para brindar qualquer coisa boa.”Deus é entusiasmo”, afirma Dalai Lama. E viver é difícil, conviver é dificílimo, superar obstáculos é, muitas vezes, quase impossível, sabemos, mas vale tentar, vale sonhar, vale acreditar, sempre com aquela palavra em mente: ESPERANÇA.Se você puder esquecer a amargura, a desilusão, o desamor, os desentendimentos e colocar uma faixa verde em sua vida, lembrando que a esperança é o sentimento mais importante para não desistir dos desejos, por mais difíceis que sejam, poderá se alegrar e comemorar os pequenos prazeres, do seu jeito, com a sua identidade, sem comparações inúteis com a vida de quem quer que seja.Neste domingo, receba a visita de um louva-a-deus que envio para você!

gracia cantanhede

DIA DO TRABALHO

Tua palavra não se enquadra no que quero escrever,

neste primeiro de maio.

Nem o som, nem o fonema, tampouco o significado.

Não me desfaço de tudo que ouço,

mas também não registro mentiras parvas.

Não há o que comemorar. Não há vagas!

Não vejo os rostos, vejo olhos n’água,

que desfilam na grama da Esplanada.

Não há risos soltos.

Há um séquito de desamparados.

Neste primeiro de maio,

não há queima de fogos,música,

canto ou gente animada.

A não ser os pedidos de emprego que escuto.

As súplicas por um salário.

Há dor estampada na cara.

De quem não sabe como pagar as contas,

amontoadas na gaveta do armário.

Não é tempo de flores.

Não há mesa posta.

Só escuto os clamores.

gracia cantanhede

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